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Médico especialista em Ofalmologia da Escola Paulista de Medicina (Unifesp), presidente institucional do Instituto Coalizão Saúde e conselho do Hospital Albert Einstein. Não há errado na raiz, mas formação médica exige mais do que vídeos, resumos e algumas tutorias. Temos: períodos de espera variados, comunidade milenar, prática de longa duração, acesso direto a vagas de residência, ensino de excelência,experiência acumulada, criação acelerada de cursos de medicina, alta densidade de médicos por grupo de 1.000 habitantes.
A jornada para a formação de médicos é desafiadora e repleta de etapas exigentes. Não se trata apenas de adquirir conhecimento teórico, mas também de desenvolver habilidades práticas essenciais para a profissão. O processo de graduação, que dura em média seis anos, é apenas o começo de uma longa trajetória de aprendizado e aprimoramento.
O treinamento médico é uma parte fundamental da educação médica, proporcionando aos futuros profissionais a oportunidade de vivenciar situações reais e aplicar seus conhecimentos na prática. Durante a residência, que pode variar de dois a seis anos conforme a especialidade escolhida, os médicos em formação enfrentam desafios que os preparam para lidar com as complexidades da profissão de forma segura e eficaz.
Formação de Médicos: Um Caminho de Dedicação e Vocação
Entre oito e 12 anos, este pode ser o período de espera para que aquele calouro, pleno de entusiasmo e prestes a realizar um sonho (o próprio e o de toda uma família), passe a integrar uma comunidade milenar, em uma prática que remonta a Hipócrates (e mesmo bem antes). Não raro se ouve dizer que um médico é mais que um graduado em medicina. Que no médico há um certo quantum de vocação. Um direcionamento espiritual (e nada há de contraditório entre medicina e espiritualidade; há inclusive um juramento envolvido, como dito acima).
Para ser justo, essa visão não é exclusividade da carreira em medicina. Basta perguntar a qualquer outra pessoa que realizou o sonho de se formar em uma universidade. O senso de realização é algo a que descrição alguma faz jus. Mas o médico vai lidar com nada menos que a saúde das pessoas. Com a vida e a qualidade desta de uma maneira tão direta e íntima que talvez em nenhuma outra área haja uma experiência similar. Não há como reforçar o suficiente a importância de se bem preparar um médico.
Isso envolve ensino de excelência, prática supervisionada por pessoas de longa experiência acumulada, muitas (muitas!) horas de estudo e dedicação. Por isso é que causa um certo choque encontrar dados como o da Demografia Médica no Brasil 2023 (produzida pela Associação Médica Brasileira e pela Faculdade de Medicina da USP) que diz que a defasagem entre graduados em medicina e a oferta de vagas em residência médica de acesso direto em 2018 era de 3.866 cadeiras e, em 2021, aumentou para 11.770.
A Demografia Médica 2024, do CFM (Conselho Federal de Medicina), mostrou que o Brasil tem pouco menos de 576 mil médicos atualmente. No início da década de 1990, eram pouco mais de 131 mil. O total mais que quadruplicou. A população brasileira, no entanto, passou de cerca de 144 milhões para cerca de 205 milhões – um avanço de aproximadamente 42%. Alguma coisa aconteceu para que houvesse esse imenso descompasso.
O fenômeno que talvez se sobressaia no nosso contexto seja o da criação acelerada de cursos de medicina no país. Dispor de médicos em profusão pareceria algo bastante positivo, não? Como diria a Rosalinda de Como Quiserem, de Shakespeare, não há como querer demais uma coisa boa. Mas o levantamento do CFM mostra que a cidade de Vitória (capital do Espírito Santo) tem cerca de 18,7 médicos por grupo de mil habitantes – densidade que talvez só alguns países desenvolvidos apresentem. O erro nesse quadro está em que em algumas cidades do Amazonas há 0,2 médico por mil habitantes (baixíssimo como em muitos países pobres).
Na raia paralela, temos a influência das redes sociais sobre a atividade de alguns médicos. Não há nada de errado em médicos fazerem uso de um meio que, de qualquer ângulo que se olhe hoje, parece ter vindo para ficar. A questão é que alguns ‘não-médicos’ acabam disseminando fake news, desinformação, vendendo tratamentos, procedimentos e curas – e, valendo-se da disposição de tantas pessoas em aceitar a
Formação de Médicos: Um Compromisso com a Saúde e a Ética
informação sem questionar, prejudicam a relação de confiança entre médicos e pacientes. A formação de médicos deve incluir não apenas o conhecimento técnico, mas também valores éticos e responsabilidade social.
O desafio da formação de médicos vai além do número de profissionais disponíveis. É necessário garantir que esses profissionais estejam adequadamente preparados para lidar com as demandas de uma sociedade em constante evolução. Isso inclui a capacidade de trabalhar em equipe, de se adaptar a novas tecnologias e de oferecer um atendimento humanizado e de qualidade.
A história da formação de médicos remonta a séculos atrás, com os ensinamentos de Hipócrates e a tradição de excelência que perdura até os dias atuais. A prática médica é uma arte que se aprimora com o tempo, e a experiência acumulada ao longo dos anos é um dos pilares da medicina moderna.
A oferta de vagas em residência médica é um ponto crucial na formação de novos médicos, pois é nesse período que os profissionais têm a oportunidade de colocar em prática os conhecimentos adquiridos durante a graduação. No entanto, a defasagem entre o número de graduados em medicina e as vagas disponíveis tem sido um desafio para o sistema de saúde brasileiro.
É fundamental que haja um equilíbrio entre a criação acelerada de cursos de medicina e a qualidade da formação oferecida. A densidade de médicos por grupo de habitantes não deve ser o único indicador de sucesso na área da saúde, pois é a qualidade do atendimento prestado que realmente faz a diferença na vida das pessoas.
A formação de médicos é um processo contínuo, que exige dedicação, comprometimento e atualização constante. Os desafios enfrentados pelos profissionais de saúde são variados e exigem uma abordagem multidisciplinar para garantir o bem-estar da população. A formação de médicos é mais do que uma simples transmissão de conhecimento; é um compromisso com a saúde e o bem-estar da sociedade.
Fonte: @ Veja Abril