Grande Rio, Salgueiro e Portela trazem enredos literários e termos como história, sensorial, intelectual e medicina para a avenida.
Os livros são uma fonte inesgotável de conhecimento e entretenimento. Eles nos transportam para diferentes realidades, nos fazem refletir e nos fazem viajar sem sair do lugar. A leitura de uma boa obra pode transformar a forma como vemos o mundo, ampliar nossos horizontes e nos fazer enxergar além do óbvio.
A escrita de um autor talentoso é capaz de nos cativar desde a primeira página. Ela nos envolve, nos emociona e nos faz ansiar por mais. Cada livro carrega consigo uma parte da alma do escritor, uma parcela do seu pensamento e da sua criatividade. Ler é se conectar com outros universos, absorver diferentes perspectivas e enriquecer a nossa maneira de enxergar o mundo. Não há nada como perder-se em uma boa história, seja ela contada em livros, em filmes ou em qualquer outra forma de expressão.
A presença do livro na tradição carnavalesca
É essa narrativa sensorial e intelectual que é aguardada por quem acompanhar os desfiles da Marquês de Sapucaí, no Rio de Janeiro, no carnaval deste ano. No mínimo cinco escolas se inspiraram em obras da literatura ao criar as composições.Tecnicidades. O escritor Alberto Mussa vai ser um dos autores privilegiados por ter uma obra dele como referência no Sambódromo.
Apaixonado pelo carnaval, ele foi criado em uma família que sempre teve laços sólidos com as agremiações cariocas. O tio, conhecido como Didi, foi compositor da União da Ilha e do Salgueiro. Escreveu sambas populares como É Hoje e O Amanhã.
A inspiração carnavalesca do livro ‘Meu Destino É Ser Onça’
O escritor torce para as duas agremiações desde pequeno, mas vai acrescentar uma terceira torcida em 2024 para a Grande Rio, escola de Duque de Caxias, na região metropolitana do Rio de Janeiro, que tem o livro dele, ‘Meu Destino É Ser Onça’, lançado em 2009, como principal referência do samba-enredo.’Fiquei felicíssimo. Talvez seja o maior prêmio da minha carreira de escritor.
Algumas obras literárias viraram enredo e deram origem a sambas antológicos. Como ‘Macunaíma’, ‘Os Sertões’, ‘A invenção de Orfeu’.
O livro ‘Meu Destino É Ser Onça’ na tradição literária
Há uma série de clássicos da literatura brasileira que figuraram nesse universo e, de repente, me ver dentro desse rol, é um orgulho muito grande, uma felicidade enorme’, disse Mussa.A obra do escritor parte de registros da cultura tupinambá feitos pelo frade André Thevet, em 1550, e outras fontes dos séculos 16 e 17 para reconstituir o que teria sido o texto original de uma narrativa indígena.
Ele conta que ficou satisfeito ao ver as ideias do livro transportadas para o enredo de samba.’Eu achei muito bem feito. O samba evidentemente não vai dar conta do livro todo. E o enredo também não é apenas sobre o livro. Ele vai além. Eles ampliaram essa visão da onça, extrapolaram o universo tupinambá e trouxeram outras culturas originárias da América do Sul.
Livros como fonte de inspiração para os enredos de carnaval
E tiveram uma solução muito inteligente no enredo. No início, fala do mito de criação do mundo.
Para Mussa, o número expressivo de escolas de samba que usaram livros como fontes dos enredos deste ano reforça que o carnaval sempre esteve preocupado em trazer discussões sociais importantes para a Avenida.
Livros como fonte de discussões sociais nos desfiles de carnaval
A festa é folia, diversão, mas também um espaço de conhecimento.’Se a gente pensar bem, historicamente figuras emblemáticas, que hoje são símbolos nacionais vão aparecer nos sambas. Caso do Zumbi dos Palmares, no Salgueiro em 1960, a Teresa de Benguela, mulher escravizada com vida de rebelião e contestação, que era desconhecida e virou enredo da Viradouro nos anos 90.
Esse espaço das escolas de samba sempre foi de vanguarda, de muita discussão sobre a cultura popular e povos brasileiros de origem não europeia que sempre ficaram relegados e considerados culturalmente inferiores’, diz o escritor.Outras escolas de samba encontraram inspiração na literatura.
O enredo baseado no livro ‘Um Defeito de Cor’
A Portela tem o enredo baseado no livro ‘Um Defeito de Cor’, lançado em 2006 pela escritora Ana Maria Gonçalves.
A obra conta a saga de Kehinde, mulher negra que é sequestrada no Reino do Daomé, atual Benin, na África, quando tinha oito anos de idade, e trazida para a Bahia, onde é escravizada.A partir dessa história individual, são tratados temas importantes como a exploração de africanos e descendentes na diáspora, assim como processos de luta e resistência durante oito décadas no Brasil.
Enredo baseado na obra de Davi Kopenawa
A queda do céu, livro do yanomami Davi Kopenawa e do antropólogo Bruce Alberts, é a principal referência para o desfile do Salgueiro.
A partir dele, a escola construiu um samba dedicado a exaltar a mitologia yanomami e defender a Amazônia. O enredo é apresentado pelo título Hutukara, que na língua yanomami significa ‘o céu original a partir do qual se formou a terra’.Temas como o aquecimento global e o desmatamento também vão ser abordados.
Referência ao almanaque do período medieval
Assim como a história de mais de mil anos dos yanomami na maior Terra Indígena (TI) do país, ao norte do Brasil e sul da Venezuela, nos estados do Amazonas e Roraima, nas bacias do Rio Negro e do Rio Branco.A Porto da Pedra, de São Gonçalo, vai apresentar o desfile sobre intitulado Lunário Perpétuo: A Profética do Saber Popular.
A referência é ao almanaque do período medieval, escrito na Espanha por volta do século 14, que chega 200anos depois ao Brasil. E passa a servir de guia para a medicina, agricultura e pecuária locais.
Enredo baseado em cordel escrito há mais de 100 anos
A letra é baseada em um cordel escrito há mais de 100 anos pelo poeta paraibano Leandro Gomes de Barros.
Na história, uma mulher cigana deixa um testamento, que serve como um manual da sorte para indicar o destino das pessoas, interpretar sonhos, decifrar a astrologia e o futuro.Este conteúdo foi criado originalmente em Agência Brasil.versão original
Fonte: © CNN Brasil